Síndrome do impostor
No papo de psicóloga de hoje, vamos falar sobre um tema polêmico, que se chama “Síndrome do impostor”, talvez você já tenha ouvido falar, pode ser que inclusive carregue ela com você diariamente e ainda não tenha se dado conta, então leia a matéria até o final para entender melhor o que é, como identificar e o que fazer para manejar esses pensamentos cruéis e sabotadores que podem estar bastante enraizados aí dentro da sua mente.
Para início desse papo, quero que saiba que quando falamos em síndrome, estamos falando em algo que não é uma doença ou transtorno psiquiátrico, mas sim a um conjunto de sinais e sintomas que ocorrem ao mesmo tempo e assim dão corpo para uma explicação adequada sobre uma condição que pode afetar a mente e o corpo do ser humano.
Nem todas as síndromes podem ser diagnosticadas com testes, porque algumas são apenas um modo de funcionamento psicológico, mas devido ao amplo público acometido por algumas síndromes, algumas já possuem testagens desenvolvidas para detectar sinais e sintomas de alerta. Temos dois exemplos ótimos que são a síndrome de burnout e a síndrome do impostor, que não podem ser caracterizadas como uma doença, mas sim uma combinação de manifestações físicas, emocionais e comportamentais que podem ter várias causas, elas já possuem testagens que ajudam no processo de entender se você realmente possui ou não a síndrome.
Então, podemos entender que a síndrome do impostor que é nosso assunto de hoje, não é um transtorno psiquiátrico ou doença que possui um tratamento medicamentoso, mas que pode ser rastreada através de testes e de uma observação adequada de um profissional que com isso poderá ajudar a traçar caminhos mais eficazes dentro daquilo que chamamos de projeto terapêutico, que é o nome que damos para o percurso de tratamento de um cliente dentro da psicoterapia.
A Síndrome do Impostor é caracterizada principalmente pelo sentimento constante que uma pessoa tem de não ser merecedor(a) de suas conquistas, mesmo tendo incansáveis provas de que é uma pessoa competente. Esse realmente se torna um grande problema na vida do ser humano que carrega consigo a síndrome do impostor(a), já que para uma auto estima sadia e para mais qualidade de vida também é importante que a gente consiga ter uma percepção realista sobre nossos feitos, performance e merecimento da subida de degraus em qualquer quesito que estejamos tentando melhorias ou evolução.
Uma percepção distorcida sobre si mesmo faz você enxergar problemas onde não existe, podendo trazer grandes conflitos aos seus relacionamentos amorosos, de trabalho ou interpessoais de maneira geral. Muitas vezes fará com que você acabe deixando escapar grandes oportunidades por não sentir que consegue dar conta daquilo que estão te confiando, pode ser um novo cargo ou um novo emprego por exemplo. Esse funcionamento produz um ciclo vicioso de perfeccionismo, auto cobrança extrema e muita frustração, já que o resultado perfeito não é algo real e nunca poderá ser alcançado, assim diariamente precisa se conviver com o sentimento de fracasso, como se nada que conquistou na sua vida fosse realmente importante ou merecido.
É muito comum ouvir das pessoas que carregam a síndrome do impostor que eles se sentem constantemente enganando as pessoas em relação a sua inteligência ou qualquer outra habilidade envolvida na sua performance. Existe um medo constante de “ser descoberto” como se estivesse cometendo algo muito impróprio e que as pessoas descobrirem será só uma questão de tempo. Isso faz com que essas pessoas estejam boa parte do seu tempo em alerta, sempre achando que coisas que deram errado foram culpa sua, mesmo não tendo argumentos suficientes que sustentem essa afirmação. Dificilmente você conhecerá uma pessoa que carrega a síndrome do impostor que é pouco exigente com algum tipo de conduta na sua vida, isso quer dizer que aqui se instala a maior ironia da síndrome do impostor, geralmente são excelentes naquilo que fazem, justamente por serem muito exigente, entretanto, todos conseguem ver isso, reconhecer e dar a importância merecida, menos ele(a).
Agora que você já entende um pouco sobre esse funcionamento e talvez até já esteja se identificando com algumas características, vou te falar como fazer para entender se você possui sinais de alerta para essa síndrome traiçoeira que não te deixa sentir merecedor do orgulho de ser quem você é. Lembrando que: esse não é um passo a passo para um auto diagnóstico, são apenas sinais de alerta que você pode se identificar ou não, nada substitui o olhar cuidadoso de um profissional capacitado para isso.
Agora, se você sente:
1. Dificuldade para reconhecer suas conquistas
– Você atribui seus sucessos à sorte, ao acaso ou à ajuda dos outros, em vez de reconhecer seu esforço e competência.
– Por exemplo: “Só consegui esse emprego porque ninguém mais aplicou.”
2. Medo de ser “descoberto(a)”
– Há um medo constante de que as pessoas percebam que você “não é tão bom quanto parece”.
– Pensamento típico: “É só questão de tempo até que alguém perceba que eu não sei o que estou fazendo.”
3. Perfeccionismo excessivo
– Você acredita que tudo o que faz precisa ser perfeito e se sente incapaz de lidar com falhas ou críticas.
– Muitas vezes, procrastina porque teme não fazer algo “bom o suficiente”.
4. Comparação constante
– Você se compara frequentemente com os outros, sentindo-se inferior mesmo quando está no mesmo nível ou além.
– Exemplos: “Fulano é muito mais inteligente do que eu” ou “Só consegui isso porque o outro desistiu.”
5. Autossabotagem ou medo de assumir desafios
– Evita desafios porque acredita que não será capaz de atender às expectativas, mesmo tendo habilidades suficientes.
– Ou, ao contrário, assume muitos desafios para “provar seu valor”.
6. Validação Externa Constante
– Sente necessidade de ser elogiado ou reconhecido, mas mesmo quando isso acontece, descarta os elogios como “exagerados” ou “não merecidos”.
7. Ansiedade ou exaustão constante
– O esforço para manter a aparência de “competência” pode gerar desgaste emocional, cansaço mental e altos níveis de ansiedade.
É possível confirmar se carrego a síndrome do impostor?
Sim, principalmente se combinarmos algumas maneiras de analisar seus sinais e sintomas:
Você pode começar fazendo um rastreio através da sua autoavaliação:
Faça perguntas, como:
– Eu sinto que meu sucesso é fruto de sorte ou circunstâncias externas?
– Tenho dificuldade em aceitar elogios?
– Tenho medo de ser julgado(a) ou “descoberto(a)” no trabalho ou na vida pessoal?
Você também pode solicitar para que sua psicóloga faça uma escala validada. Existem questionários específicos, como o Clance Impostor Phenomenon Scale (CIPS), que ajudam a identificar se você está vivenciando a Síndrome do Impostor.
Por último e tão importante quanto os demais, se você ficou em dúvida e se identificou com o tema, converse com um profissional. A psicologia pode te ajudar a identificar os padrões de pensamento e te auxiliar a criar estratégias para superá-los.
Entendo que nem sempre podemos ir a um profissional investigar, precisamos nos organizar financeiramente e nem sempre a psicoterapia é a primeira opção, porém se você quer começar por algum lugar, pode começar lendo livros sobre o tema e assistindo vídeos que falem sobre o assunto, isso pode te ajudar bastante a entender melhor o assunto, principalmente através dos relatos de pessoas que talvez já tenham atravessado o mesmo desafio e atualmente se encontram em outra fase do processo.
Deixo aqui uma dica de leitura leve e bastante simples sobre o assunto que é o livro da Rafa Brites. Muito conhecida através da televisão, ela é uma mulher de sucesso que conta um pouco da sua vivência com a síndrome. É possível comprar online o livro impresso, áudio livro e também o livro em arquivo para ler no seu kindle, computador ou celular.
E para quem gosta de leitura científica, temos também algumas opções de artigos acadêmicos para ler e se aprofundar mais no tema:
1 – Entre fraudes e verdades: A síndrome do impostor no divã reichiano
Autor: José Henrique Volpi.
2 – Síndrome do Impostor: Desafios e Prevenções
Autores(as): Sidny de Almeida Molina; Maria Luiza Blanco Moraes; Ronaldo Bordin; Rita de Cassia Nugem.
https://doi.org/10.1590/SciELOPreprints.5797
3 – Escala Clance do Fenômeno do Impostor: Adaptação Brasileira.
Autores(as): Thereza Christina Garcia Bezerra; Larisse Helena Gomes de Macêdo Barbosa; Katia Correa Vione; Rebecca Alves Aguiar Athayde; Valdiney Veloso Gouveia.
https://doi.org/10.1590/1413-82712021260211
Se você chegou até o fim dessa matéria imagino que possivelmente conviva com a síndrome, seja dentro da sua própria mente ou com alguém que convive diariamente e ama muito, quero que saiba que eu sinto muito. Sinto muito por não terem te ensinado a validar sua própria existência, sinto muito por não ter aprendido a quão valioso(a) você é, sinto muito por você não ter aprendido a enxergar o quanto merece todas as suas conquistas. Mas desejo que entenda que a única pessoa responsável por mudar essa realidade agora é você. Podemos e devemos entender nosso passado, para que ele não se repita incessantemente no modo automático, mas serve apenas como guia para que a gente possa traçar novos caminhos, que sejam mais gentis e leves para nossa existência como ser humano. Desejo que você possa enxergar seu valor e consiga sentir orgulho disso.
Com carinho,
Talita Ferraz
Psicóloga clínica – CRP: 12/21626
@talitaferrazz – (48) 998370630