VOCÊ SABERIA SALVAR ALGUÉM? PROVAVELMENTE NÃO.
É desconcertante pensar que, em uma situação crítica, a vida de uma pessoa pode depender do conhecimento de quem está ao lado – e esse conhecimento simplesmente não existir. Em regiões turísticas como o Extremo Sul Catarinense, onde o turismo de natureza, praias e trilhas cresce exponencialmente, essa ausência de preparo é um risco silencioso que precisa ser exposto.
Tanto moradores quanto turistas e visitantes, em geral, não sabem como agir em situações de urgência ou emergência. Muitos sequer sabem que esses dois termos têm definições diferentes.
Segundo o Ministério da Saúde, URGÊNCIA é uma condição de causa imprevista que exige atendimento rápido, mas que nem sempre envolve risco de vida (exemplo: fraturas ou convulsões). Já a EMERGÊNCIA é uma situação crítica e iminente de morte ou perda funcional de órgãos, como paradas cardíacas ou afogamentos graves.
Parece algo distante? Mas não é.
Casos e situações descritas abaixo são hipotéticas que indicam o despreparo generalizado. São observações construídas com base em comportamentos recorrentes:
Queda em trilha em trilhas como as dos cânions de SC
Um turista/visitante escorrega durante a sua caminhada e teve fratura exposta em uma das pernas. Seus amigos tentaram carregá-lo até a estrada. O esforço agrava a lesão e provoca hemorragia e outras complicações.
O que seria correto neste caso? Primeiro não realizar a atividade sem um guia/condutor credenciado na trilha ou que pelo menos conheça o local e suas realidades. E sobre o ocorrido a imobilização adequada seria o mais correto e logo que possível acionar o 192 (SAMU), manter a vítima aquecida e em local seguro e aguardar pelo socorro.
Criança afogada na praia ou lagoa da região
Sem guarda-vidas por perto, a criança entrou em parada respiratória. Nenhum adulto próximo sabe aplicar a manobra de RCP. Quando o resgate chega, o tempo de resposta já era insuficiente.
O que seria o ideal neste caso? Primeiro sempre buscar um local sob olhares dos guarda-vidas. E sobre o ocorrido, e se possível, iniciar compressões torácicas imediatamente, ligar para o 193 (Bombeiros) e manter a vítima em posição segura.
Picada de serpente nas trilhas de mata e/ou campo
Uma mulher foi picada por uma jararaca ou outro tipo de serpente. Amigos que a acompanha, ou pessoas próximas, aplicam torniquete e tentam sugar o veneno. Resultado: quadro agravado, risco de necrose.
A conduta correta neste caso? Novamente estar acompanhada de um guia ou condutor local. Mas, neste caso, não cortar, não sugar, não amarrar é o correto. Manter o membro imóvel e deslocar a vítima rapidamente ao hospital mais próximo e com o soro adequado.
Esses exemplos são reconstruções baseadas em relatos típicos de guias, bombeiros e moradores, mas servem como alerta: situações parecidas acontecem com frequência e muitas delas terminam mal justamente por falta de preparo básico.
Ignorância Letal e Omissão Social
A sociedade brasileira é rápida em buscar culpados e lenta para buscar capacitação. Ainda que cursos gratuitos de primeiros socorros existam, a população em geral não se interessa. Turistas se preocupam com as melhores selfies ou custo mais barato – isso quando se arriscam sozinhas. Raríssimas vezes se preocupam com as rotas de evacuação ou com o hospital mais próximo. Guias e monitores, muitas vezes não capacitados, são colocados como responsáveis por grandes grupos — sem apoio nem equipamentos adequados ou até mesmo se dizendo “credenciados”.
Fato normal não só na região do extremo sul catarinense, mas em todo o território nacional.
A crítica é inevitável: não se trata apenas de desconhecimento, mas de negligência coletiva. E o poder público também é parte do problema. Faltam campanhas contínuas de prevenção, exigência real de capacitação em turismo de aventura, e investimentos em sinalização e acessibilidade a serviços de urgência.
Conclusão: Uma crítica ao desconhecimento
Se a minha crítica parece dura, ela ainda é branda diante da gravidade das situações que encontramos diariamente não só em atividade de turismo, mas nas cidades e seu entorno.
Vale lembrar que cobrar apenas da população o preparo é injusto. É preciso que prefeituras, secretarias de turismo, secretarias de saúde e educação, Parques e outros serviços também ligados ao setor turístico se unam. Esforços e ações sistemáticas podem e devem acontecer, como:
– Treinamentos de primeiros socorros nas escolas e comunidades;
– Capacitação obrigatória para guias e condutores locais;
– Incentivo a campanhas educativas nos pontos turísticos;
– Divulgação visível dos números de emergência e locais de atendimento;
– Repasse de informações vitais aos visitantes e turistas;
– … e muitas outras ações…
Turismo seguro também é cultura.
E cultura se constrói com prevenção.
Segurança é informação e responsabilidade mútua.
>>> NOTA <<<
Entrou em vigor nesta última semana de julho/20225, a Lei nº 19.382/2025, publicada no Diário Oficial na quinta-feira (24). Ela regulamenta a profissão de GUIA DE TURISMO EM SANTA CATARINA. Um dos principais pontos da nova legislação é a obrigatoriedade da contratação de um guia de turismo local para acompanhar grupos de visitantes dentro do estado, mesmo que esses grupos já estejam acompanhados por guias nacionais ou internacionais.
A lei também estabelece penalidades para o exercício irregular da profissão. Quem atuar como guia sem o devido registro ou com cadastro vencido estará sujeito a sanções previstas na Lei Federal nº 11.771/2008, como a advertência verbal. Empresas que contratarem guias irregulares também poderão ser penalizados. (https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=481581)
Luiz Fernando Soares
Técnico e Gestor de Turismo – Cadastur 24.016176.96-2
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fernando.tectur@gmail.com
https://www.tec.tur.br/

Coluna Caminhos do Mar e das Alturas
O nome desta coluna evoca a conexão do homem com as atividades entre a grandiosidade dos cânions regionais e a serenidade das praias, criando uma identidade única para a coluna. Reforça o simbolismo da jornada e da conexão entre os elementos da região, com conteúdo envolvendo os segmentos que atendem e direcionam o turismo regional.
Como diretor da TecTur Turismo, sou guia de turismo credenciado nos Parques Nacional de Aparados da Serra e Serra Geral, especificamente na 9ª Região Turística Caminho dos Canyons do Sul – Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Sou apaixonado pela fotografia de natureza e das aventuras em que participo, além da consultor e orientador no segmento do turismo rural. Também realizo trabalhos como coordenador e difusor de estratégias e análises no segmento de pesquisa político/administrativo. Gaúcho de Porto Alegre, há mais de 20 anos resido com minha família em Santa Catarina, atualmente no centro de uma região com turismo 12 meses por ano: Sombrio.